Ismael viu a nova plantação
De lâmpadas fluorescentes
Que crescem na roça do seu João
Embaixo do linhão
Acendem nas madrugadas
Roubando a cena dos vaga-lumes
Que fogem envergonhados
A força da indução
Na quebrada que come luz
Gera fetos de milho mal formados
Povo de coração mole e barriga dura
Prematuros de sofrimento
Órfãos da proteção
Tratados como uma peça corroída
Que precisa ser trocada
Apertados com chave de fenda
Cada vez mais pro canto da cidade
Vivendo em alta tensão
Fios desencapados
Isolados com fita isolante auto fusão
Ismael viu os corpos eletrocutados
As cinzas caindo do céu
As mãos lançando raios
O líquido vermelho, fervendo
Tingindo o calçamento
Tanta energia gasta
Em nome do patrimônio alheio
Pouca disposição pra luta
Tantas portas fechadas
Pouca roda pra muito freio
Ismael viu o sol irradiando radiação
A chuva ácida corroendo o aço
Os efeitos colaterais
Vindo das beiradas, das laterais
De um lugar jogado pra escanteio
Um povo que joga na raça
Sempre derrubado na área
Mas, nunca pode cobrar o pênalti
Impedidos, rebaixados
Levam dribles da felicidade
Ismael viu o choque de 10 mil volts
Incendiando a alma
Modificando a genética
Despertando o vulcão do câncer
A visão de raio-X
Leu as entrelinhas do mundo
As placas tectônicas entrando em atrito
Tremendo as mãos de cirrose
Dos homens de rosto enrugado
E pele queimada de sol
Ismael viu a morte
Com seu uniforme de trampo
Cartão ponto na mão
Registrando as horas extras
Capacetes, capacitores
Ferramentas, disjuntores
Conjunturas conturbadas
A ferrugem corroendo as esperanças
A vida por um fio de cobre
Ismael sonha com o dia
Em que o espantalho ganhará vida
E esse povo mutante
Em constante mutação
Brilhará alto
E assaltará os céus da cidade
Nenhum comentário:
Postar um comentário