O ator tomba sem vida, enforcado em sua própria gravata. No centro do palco sentada em uma poltrona, toda poderosa, a atriz esboça um sorriso. As luzes se apagam, a platéia se levanta e irrompe em aplausos. As luzes se acendem e a atriz diz: “tem algo estranho acontecendo nesse país... estão aplaudindo o crime”. Os aplausos ganham mais força.
Esse é o final da peça “Alzira Power”, de Antônio Bivar e
direção de Gustavo Paso, encenada no Iguaçu Boulevard em 2008.
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“Essa musica aqui é direcionada diretamente pra sociedade,
que aplaude nosso sangue escorrendo, nosso povo sofrendo, por isso esses versos
aqui são sem aplausos”.
Essa foi a fala do grupo Rajada Mc's de Campo Mourão no
evento chamado “A Voz do Interior”, que aconteceu em Cianorte, interior
paranaense, em dezembro de 2011. Foi o
discurso de abertura da música “Mais um Verso sem Aplauso” que será lançada em
seu novo álbum intitulado NovaMente.
A música do RJD é muito interessante e traz uma discussão
importante sobre aquilo que se deve ou não ser aplaudido na sociedade atual.
Vivemos nos dias de hoje sobre uma espécie de “ditadura do aplauso”. É a
banalização do aplauso em programas de auditório, shows de celebridades e
comícios, levando em conta que boa parte dos aplaudidos merecem na verdade uma
enorme vaia.
“É mais um verso sem aplauso / Se no baque da quadrada eu
vejo o sangue escorrendo no asfalto / É mais um verso sem aplauso / Crack,
cachimbo, caixão, nóia que vira finado”.
A música nos trás fragmentos de tudo o que é mais doloroso
pra um morador de favela e bairros periféricos: O abandono do governo, a fuga
nas drogas, os assassinatos, a fome, o desemprego, a corrupção, a criminalidade
e a falta de perspectiva de uma juventude jogada ao léu. Uma cena triste que
não merece aplausos.
O rap é um dos poucos gêneros musicais da atualidade que
ainda foca suas composições na denuncia de um sistema que está a favor de uma
minoria. Nesse contexto pós-ditadura militar, não temendo as represálias, o
Movimento Hip-Hop teve a coragem de dizer que o rei continua nu, e que nossa
democracia é ditadora.
A peça de Bivar, cujo título original é “O Cão Siamês” foi
escrita em 1969, enquando o Brasil amargava uma ditadura militar e uma parte da
sociedade também aplaudia os crimes cometidos pelo regime.
A maioria dos militantes do Hip-Hop se posicionam na
contramão da cultura dominante e ainda sofrem grande pressão do mercado e da
indústria cultural para abandonar o discurso áspero e produzir um rap mais
colorido, ameno e que se limite ao entretenimento.
Nessa canção o Rajada traz também a discussão sobre o
preconceito com o rap e a favela:
“Nóis
é rap, é
favela, de marginal somos chamados / Mas na verdade
somos marginalizados”.
Podemos observar que acontece por parte da elite, uma
tentativa de rebaixar a favela e as suas manifestações culturais, como uma
forma de desqualificar o discurso. Cria-se
uma relação de poder entre quem tem o aval para falar e expor sua visão, e
aqueles que só podem escutar.
O ministério RJD adverte: Mais um verso sem aplausos, e
nenhum minuto de silêncio.
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